segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Encontro ausente

Era uma noite chuvosa, Sabrina não sairia mais ao encontro de quem não viria. Todas as noites era o mesmo ritual. A roupa escura, o scarpin de verniz e o cabelo naturalmente encaracolado para esperá-lo naquela esquina. A mesma esquina em que houve aquele adeus.

Ao total foram três anos de encontros e desencontros. Todos os dias, na mesma hora lá estava ela, naquele local. Já conhecia o porteiro da Igreja, o guardião que passeava com os cães da vizinhança, o andarilho que todos temiam. Independente do momento, das pessoas que por ali passavam, lá estava ela. A espera de alguém. Alguém que não viria.

Certas noites, fora porque quis, por pura e inocente esperança. Nenhum recado, nenhum sinal e lá estava Sabrina. Debaixo da chuva ou do sol. Com o céu estrelado. Frio ou calor. Era chegar, acomodar-se naquele banquinho e esperar por um momento que não chegaria nunca. O ritual prosseguia. Ela voltava para seu lar, sua família e nada.

Em outras ocasiões, porém, Sabrina ia por um motivo a mais. Pedro mandava mensagens, mandava sinais. Às vezes subliminares, eu sei. Mas mandava. Sabrina comparecia. Voltava ao local do crime. Revia imagens, sentia arrepios e, o máximo de seu amado que encontrava era um olhar. Olhar discreto e ao mesmo tempo intenso. Olhar intrínseco. Olhar único. Olhar ausente, inexistente. Nada de olhar.

E assim Sabrina seguiu sua vida por três anos. Seu marido, seus filhos, amigos e quem mais a tivesse em convívio sabia da história, indagava a jovem senhora e ficava sem entender. A própria Sabrina não entendia. A própria Sabrina condenava e prometia não mais se deixar envolver...

Até a próxima noite, o próximo contato. A próxima nostalgia. Era sentir aquele aperto no peito e lá estava ela. A espera de Pedro. A espera de seu amado. Na volta para casa, a mesma angústia, a mesma vontade de recomeçar. Sabrina sabia que, na vida, sempre há um recomeço, sempre há uma nova chance.

Naquela noite, naquele dia, resolveu recomeçar. E recomeçou. Foi até a praça e resolveu entrar no hospital. Sentou-se ao lado de Pedro. Passou a mão pelo corpo de seu amado, deixou mais uma lágrima cair e sussurrou: “descanse em paz, meu amigo”. Logo em seguida levantou-se e autorizou ao médico a desligar os aparelhos que mantinham seu velho cão em coma induzido.

Um comentário:

Ricardo Bianchetti disse...

Quebra de expectativa o_O
Não sei se foi uma boa metáfora bem escondida ou um desejo de transformar em cômico o que era dramático...se foi a segunda,parabenizo pela jogada ousada,caso a resposta é a primeira,parabenizo pelo comovente texto!